terça-feira, 23 de dezembro de 2014

caos

por acaso
traga caos
que causo
sem causa.

no caso
perder
a calça
não seria
a causa
de caos
na calçada.

domingo, 16 de novembro de 2014

passa

olha aí
o carnaval já passou.
e ano após ano
após ano após ano
passa.

todas as mil apoteoses
passaram, olha lá.
e elas nem constam
tanto assim, e agora
aromas de sangue e noz-moscada
vem encher a calçada
de gritos de orgasmo
e de mau humor.

na mesma rua há
uns velhos rangendo
a sobra dos dentes
que aliciam o tempo
na calçada das damas que,
apenas enterram os pés no asfalto
construindo casas e nuvens.

e o fim, ah! o fim
em si mesmo não é nada
luzes apagam e ascendem.

o samba está na rua
todo santo dia,
e não santos também.


Fonte: google imagens

domingo, 5 de outubro de 2014

meu nome

Minha mãe quis
por-me o nome:
Vinícius.
Meu pai, sei lá:
Eduardo.

meio louca esta ideia
meio torta esta vida
meio digerível esta jornada
meio manjada esta poesia

não é fácil
levar esta vida
contando histórias
pra boi dormir
até bater as botas

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

sermão da sorte

Ela é deus,
Ninguém mais diga nada!
Você viu que
o que não chega
a ser literatura
mas que compõe este sermão.

Relendo cada verso no fim,
ainda restarão argumentos desconexos,
insetos incômodos, amores mal vestidos
barbeadores elétricos, monstros alados
e seguros de vida vencidos.

É a vida: acertada e errada com a sorte,

enquanto imploramos e roubamos
e pegamos emprestado.
e nunca, nunca vemos de volta
vontades descarregadas a mil megabytes:
nem mesmo vou falar delas em vão.

Apenas algumas palavras
e o radical de seu nome
restam em minha memória.

crisálida
crisma
cristal
cristo
crista
CrisPenoni



quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Inspiração

Então agora entre nós
Vai ser desse jeito:
você vem, me aceita,
com todos os defeitos
e sai, muda.

Você foi meu verbo
habitou minha carne
até ao pus, e mesmo
sem poder falar
me deixa, surdo.

O amor vai superar tudo
os santos só não avisaram
da tua partida, e eu,
sem paciência pra esperar
me corto, cego.

Seus beijos ainda
queimam minha boca
e o verbo voltará
a circular meu corpo e
me proverá, amargo.

Porque é assim entre
eu e minha inspiração:
ela me faz feliz, me cria,
batiza meu filho mais novo e
me deixa, apagado.

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

seca

eu sou um
você é vários
ele é tudo
nós somos nada.

e apesar disso
temos o mundo
pelas costas
e dois lados
de um caminho
de obras inacabadas.

tudo seca:
tinta seca,
planta seca,
a fonte seca...

mas o lago
em que ponho
os pés agora
está coberto
de pensamentos
amarelos
brancos
verdes
e roxos.

até mesmo
os pensamentos
secam.

quinta-feira, 31 de julho de 2014

presença canina

porque todas as bombas
resolveram cair
em minha cabeça
hoje de manhã.

porque o sol queima
todas as minhas fraturas
expostas ao vento

porque me deram
um lenço umedecido
para limpar as partes
ocultas de minha face

mas eu tenho um cão.
vou com ele pra varanda
saio e sigo por aí

juntos reviramos
as latas de lixo
e os jornais velhos
do centro da cidade

mas minha cabeça explode
como num campo de guerra.
é mesmo assim.

os fragmentos vão parar
no lixo, nas mesmas latas
que reviramos nas noites
insonia e solidão.


Alice in Chains (1995) - fonte: Google Images

sábado, 19 de julho de 2014

resta um

resta um
canivete
tabaco
palha

resta um
açúcar
bule
café

resta um
chave
vinho
taça

resta uma
crise
rima
trilha

resta um
você
eles
eu

ninguém

domingo, 13 de julho de 2014

Erros:

esta é uma mensagem automática:

Erro: Você pode ter sido
vítima de falsificação
de software.
Clique nesta mensagem
para saber como obter
um item original.

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fez referência à memória
no "ox6f897c2". A memória
não pode ser "written".

Erro: erro não encontrado.
Pressione qualquer tecla
para formatar unidade.

Erro de verificação
cíclica de redundância. 

Erro: As definições de vírus
foram desatualizadas.

Erro: o Windows quer mais RAM

Erro: quero respirar além
dessas janelas.

Erro: quero mais vida
além da máquina.






segunda-feira, 7 de julho de 2014

metade maquina

prove que você não é um robô
digite o número de segurança
ele dirá sempre a verdade.
mas eu sou metade máquina
olhe meu relógio, nunca para,
nem por cansaço
nem por perdão

e se sou metade máquina,
não sinto o confortável passar
desse tedioso e relativo tic tac
sem verdades, sem mentiras
só a contínua batida do ponteiro,
que não tem corda
que não tem volta

sendo eu metade máquina
perdi vontades que nem tinha
me ligam cedo, me alimentam
porque nosso valioso capital
esse mesmo que compra almas,
me fez o que sou
cadáver que sou

meu motor solitário de máquina
acha absurda a ideia de ser
o que foi programado para ser
e na sua arte de esquecer,
fica apenas com o que resta,
só corpo e memória
só curto circuito



Santiago Caruso - "Arcimboldo's Syntagma" - Deus ex Machina http://galleries.santiagocaruso.com.ar/personal-argot.html

terça-feira, 24 de junho de 2014

Naufrágio Matinal

vai, pois a madrugada é vazia
não fizeste nada que sobre
não colheste porém plantaste

fostes difícil na tua luta
e agora, na noite nua
ficas a ver navios

mesmo estes naufragam
na fria vagueza
de se encarar sozinho

com teus desprazeres
com teu deita e rola,
vai, nada esperes do dia


                                   A Fraude Marginal - Lucas Ferreira

quinta-feira, 19 de junho de 2014

amanhecer morto

no último pingo de orgulho
volto pra ver a cidade e seus
automatismos cranianos
e os sujeitos atropelados
mordidos por caninos de gato
e as imagens pragmáticas
mal marcadas bem esquecidas

vi outro não-eu no olho do boteco
à beira de um ataque suicida
trabalhando vivo sólido e louco
parafraseando amor sem sentido
em links não compartilháveis
trilhas não comercializáveis
virando esquinas invariáveis

seria sorte amanhecer sem rosto
seria sorte um amanhecer roto
seria sorte amanhecer o novo
seria sorte amanhecer morto
bem posto=bem morto: desenho de Eduardo Guimarães

quarta-feira, 21 de maio de 2014

janela e-mundo

dessa minha casa
que dá para a rua
dão várias janelas
que são vários muros

da minha janela
cai um sono profundo
vizinhos brigando
na esquina do e-mundo

os vários edifícios
da minha janela
texturizam a alma

negócio difícil
na preguiça dela
persistir na calma



janela pra qualquer esquina - RJ - Foto: eduardo guimaraes.

terça-feira, 13 de maio de 2014

Burocr-Artia

um minuto por favor,
estamos transferindo 
sua ligação para 
o setor de suporte.

tudo dentro dos conformes 
será debitado em sua conta senhor
tudo o que você tem que fazer 
é assinar aqui e aqui

logo na saída tem um guichê.
e um terminal-burro com um teclado
na tela haverá um codisigno alfanumérico 
digite ʞ4Fʞ4 e aperte o enter

pois bem, criado seu desejo
digitado o signo
cifrado o código
atendendo seu pedido

o que o senhor deseja?
-desejo Burocr-Arte.
pra comer agora?
não. 
embrulhe pra viagem



http://esferografias.blogspot.com.br/


sexta-feira, 25 de abril de 2014

mata-mata!

penal - sorte!
juiz - apito!
bola - cal!
chute - tiro?
a massa - grito!
bomba - foguete!
morreu - go0o0ol!
gol - não gol?

penal perdido
azar. 
não valeu!
passou perto!

bala perdida.
sorte.
não valeu!
passou perto!

mais um morreu no
fundo do beco...





http://www.consciencia.net/pequenosdetalhes/bala-perdida



sábado, 12 de abril de 2014

mente

mente
mente?
se mente
só mente
dor mente
seca mente
tipica mente
acida mente
move mente
nova mente
ressente mente
mente,
por que mente?
frequente mente,
porque só mente?
de repente, mente..
doente mente, doente...



My mind is blowin' up
http://killeracid.com/post/50022378498/my-head-explodes-18-x-24-drawing-2013

terça-feira, 1 de abril de 2014

Depois de tudo

Um menino sai à rua.
Lê trechos do jornais
expostos na prateleira
suja como sempre.

Uns reclamam da temperatura,
outros das invasões.
Uns reclamam de bombas,
abacaxis e pepinos.
Ainda há os que reclamam
de uma vida chata
como é também chata
a vida de sua cidade.
Dos impostos, copas,
de reis vermelhos e azuis,
do cair nosso de cada dia.

Tudo isso confirma apenas
a insatisfação conhecida há tempos,
de tudo e de todos.

Sua cidadezinha está crescida?
Não se preocupe,
essa é a menor das tragédias,
embora devas considerar
o ocaso das emoções coletivas
e de memórias faltosas.

O menino só reclama de sua memória,
falha como um disco portátil
de uns poucos megabytes.
Se desce as ruas, é porque ela sabe
que esse menino ainda não sabe
decidir a quantas anda o próprio corpo.

No fim, o menino vê nada:
a poesia não pesou e nem valeu.
Não serve pra muita coisa.

depois de tantas discussões
depois de crises nucelares
depois das igrejas celulares
depois de lavadas as mãos

Seu último poema fica preso.
Infância, bolas de meia,
vertigem, medo do escuro.
Tudo isso e mais o que vai
se deletando ao longo dos anos.
Fecha os olhos pela última vez
e inventa versos que julgava saber de cor.

sexta-feira, 14 de março de 2014

desconector conectado

Acordei mais cedo,
para abrir os olhos,
e ouvir um megafone,
e tomar consciência:

Eu sou uma farsa
-a maior das fraudes-

As relações andam estreitas
como o sol anda perto de
plutão.

O maquinário está desatualizado.
A graxa das engrenagens
já secou há tempos.
Nunca vão funcionar
como antes.

Sou como um mosquito
viciado em veneno,
viciado em outras palavras.
Não vão matar,
talvez entorpeçam,
e tornem a luz das cidades
mais brilhantes do que a
iridescência binocular de minha alma.

Desconecto do seu interior
para desemborcar
uns versos como
se urinasse numa piscina,
ou como uma senhora que
lava a calçada,
a água nunca acaba?

As fontes pararam de
jorrar ha tempos.
nenhum tipo de formatação
vai me livrar de 
um anúncio per-verso como este:

O desconector foi conectado.



"deus ex machina" - BH - foto: Eduardo Guimarães

segunda-feira, 10 de março de 2014

Votos Sinceros

Sempre é bom ouvir 
uns votos sinceros,
os hipócritas, por exemplo.
A contar os tapinhas nas costas,
vou viver uns duzentos anos.
Tente imaginar o que eu digo
nessas palavras simples.

Alerta!

Sua vida acaba de ser invadida.
A ocupação pode durar
ao menos uns dez anos
antes de acabar num papel assinado.
E embora possas optar pela guerra.

Virá a fome,
As pestes virão.
Ficará roto o teu leito
antes de chegar aos
cinquenta anos.
Então sentarás na 
poltrona reclinável do papai
e assistirás ao noticiário das oito.
Mas não se preocupe,
Sempre haverá um asilo
de portas abertas.



Fatboy Slim - Weapon of Choice

quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

todo dia

Ele veio em todas as minhas viagens,
eu vi.
E ainda era como eu:
viciado em erros.
Nestas palavras de todos os dias,
em voz baixa.
Redefiniu o mundo todo em cores:
Quentes e frias.

E não é de se admirar que isto seja de se admirar.

Sol: imagem em pacote de cigarros
cai a chuva que verte 
gotas pesadas de suor e esperança
num copo com gelo.

Aqueles calos nas mãos traziam segredos,
corda, foice, revólver,
batidas em ponta de faca,
uma edição de perfume.

Li num jornal hoje de manhã
sobre quem ele era.
Mas como o amo,
e ele veio em todas as viagens que tenho feito,
eu vi.
Seguimos em frente,
sem que ninguém dissesse para onde ir,
nesse pedaço de infinito.

A terra à vista.



 

Fonte: google imagens



quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

daí que...

Por que no íntimo
prefere os dias escuros

...

E há em ti uma tal beleza
que não vale nada

...

Entre em outras sombras:
espalhe o porvir

...

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Bem-aventurados

Bem-aventurados os cegos, 
não vão ler este -sermão-? 
(não será lançado em braile).
 

Bem-aventurados os que nasceram, 
viveram e se nutriram 
para ficar esperando um táxi.
 

Bem-aventurados os caminhos 
de amores que terminam no fim. 
Amor, dessa vez foi demais...
 

Bem-aventurados os que se matam, 
mesmo não tendo sido tratados 
com pior dos vinhos...
 

Bem-aventurados os mensaleiros na cadeia, 
terão suas mensagens. 
Portanto, se está lendo isso, sinta-se abraçado
 

Bem-aventurados os que não tem certeza
pra que essas obras estão sendo construídas,
prédios, presídios e estádios.
 

Bem-aventurados os transitivos sem vírgulas, 
sem eco-femismos, flores, flores,
oh senhor das mais antigas formas de comunicação. 

Esta não soube amadurecer.



Pregador de muros - foto: eduardo guimaraes